Ecos da floresta virtual aonde mora a verdadeira guerrilha.

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segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O que é sujeira?

As grandes cidades do Brasil não passaram incólumes pela primeira fase da eleição:  a animosidade da disputa pela presidência estremeceu amizades, abalou relacionamentos familiares, apartou namorados, mas a despeito das opiniões díspares, um uníssono podia ser ouvido em todo canto da cidade, e ele dizia respeito à sujeira.
Não coloco aspas, por que falo de sujeira mesmo. Santinhos, banners, galhardetes. Em um bairro do Rio, com a chuva fina que caía, os santinhos jogados no chão se tornaram uma massa tão espessa que encobriu um bueiro, fazendo um ou outro eleitor desavisado cair no buraco. Em outra situação, uma amiga que saiu de carro achou cerca de 20 filipetas grudadas no seu carro, de candidatos diferentes. A indignação foi tão imediata, que ela guardou os santinhos no porta luvas para anotar os nomes dos candidatos e não votar neles, nem nesse pleito, nem nunca.
O santinho e a publicidade de rua em geral são, ao meu ver, o símbolo do abismo que existe entre a política que queremos e a política que temos. Basicamente temos uma maioria esmagadora de candidatos que não está conectado com os ideais mais básicos dos seus eleitores. E é por isso que identificamos tão facilmente em época de eleição, principalmente na classe média, o desejo de “fazer alguma coisa”. Fazer alguma coisa para classe média significa, por exemplo, mandar um email com um hoax sobre o poder do voto nulo, que se fosse adotado por 50% dos eleitores, anularia também as eleições, mudando todos os candidatos. Ou  xingar um coleguinha no twitter que não concorda com as suas opiniões. Basicamente, a classe média gesta por dois anos uma grande indiferença política, para com a aproximação do pleito, despejar o seu rancor por “tudo isso que está aí”. Por isso, esse abismo não é só aprofundado pela má gestão de nossos políticos, mas também pelo descaso da maioria da população com o seu voto e com sua atuação política.
E com isso, a “sujeira” vai continuar aparecendo. Nos ralos, nos para-brisas e nos emails. E a despeito do que os candidatos despejam nas ruas, depejamos também o nosso ódio, nosso medo e nossos preconceitos para justificar o nosso voto e a animosidade das nossas opiniões. Em uma eleição onde a sexualidade da cadidata favorita é questionada, juntamente com seus valores religiosos, e que isso seja tema de debate a sério entre jovens teoricamente esclarecidos, não podemos descer mais baixo. A sensação que dá é que o eleitor brasileiro ainda cai em pegadinhas. Pegadinhas mesmo, dessas de programa ruim, de canal de tv baixaria. Ainda estamos questionando se o teste de fidelidade do João Kléber é de verdade ou se aquilo tudo é armado. Alguém precisa mesmo que eu dê a resposta?
Qual sujeira é mais prejudicial para democracia do País? Se estamos tão preocupados com os bons costumes, a limpeza e a assepsia dessas eleições, por que estamos aceitando e engolindo o lixo que nos é enfiado goela abaixo, do argumento do ódio e da baixaria? A prática não é nova, mas o eleitor não aprende. O caso Lurian usurpou a eleição do Lula e elegeu Collor, e deu no que deu. Quanto mais medimos a prática política pela prática do moralismo, quanto mais usarmos termos como maconheiro, sapatona, anticristo e terrorista para nos referirmos aos candidatos, mais estaremos desqualificando nosso sistema democrático. E enquanto nos preocupamos em odiar Dilma Roussef, por ela ser mulher, por ela ter combatido a ditadura, por ela não ser bonita, por ela não estar casada, por ela ser um fantoche manipulado pelo Lula, ou por qualquer outro argumento desse nível superior de raciocínio, José Serra está sorrindo pela possibilidade de ser eleito. José Serra que articulou um movimento que acusava o PT de ser contra a liberdade de imprensa e ligou para o Ministro Gilmar Mendes para interromper uma votação do Supremo. O mesmo José Serra que desencavou um escândalo encerrado de quebra de sigilo e fez de tudo para encobrir que sua filha aviltada, na verdade era responsável pela quebra de sigilo de 60 milhões de brasileiros. É esse o presidente que queremos, governando o País com esse tipo de expediente?
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Mas no meio de toda essa massa amorfa de lixo, ainda existe alguma esperança, em diversos partidos. Vamos aos exemplos:
- José Eduardo Dutra e Antônio Palocci cordenaram a campanha de Dilma Roussef. Receberam ataques sistemáticos que envolviam a moral da candidata. Amorteceram as denúncias falsas ou irrelevantes levantadas pelos jornalões para enfraquecer sua candidatura. E em momento nenhum responderam com baixaria aos vídeos criados pelo publicitário Adriano Gehres, que tentavam criar um clima de pânico e ameaça à democracia, ou comentaram episódios escabrosos da vida de José Serra para responder aos boatos criados pelo PSDB sobre a sexualidade da candidata.
- Em Sergipe, a candidata do Psol Avilete Cruz chamou a candidata Dilma Roussef de terrorista. O Psol é um partido à esquerda do PT, sem cargo algum no governo Lula, e crítico do sistema político atual. Mas mesmo assim, seu diretório nacional achou mais ético retirar a candidatura de Avilete, já que o Psol entende que lutar contra a ditadura jamais pode ser comparado a terrorismo.
- No Rio, foi eleito expressivamente o candidato Marcelo Freixo como Deputado Estadual. Marcelo é ameaçado de morte por combater as milícias que aterrorizam comunidades carentes.
- A votação surpreendente de Marina Silva, com quase 20 milhões de votos foi um recado claro do que quer o eleitor: governanças limpas e transparentes, como é o discurso da candidata. Infelizmente parte do eleitorado ainda não percebeu que o PV se tornou uma legenda de aluguel que dá sobrevida ao DEM em diversos Estados e vai apoiar a candidatura Psdebista em SP, que nada fez pelo  meio ambiente: Alckmin em 4 anos de governo construiu pontes que impediam a passagem de bicicletas (o que é ilegal) e não fez absolutamente nada para frear o despejo de lixo e esgoto in natura nas águas da cidade. O PV é um contrasenso ambulante.
- O PV expulsou um despachante envolvido com a quebra de sigilo de Verônica Serra. (Pena que os jornais não foram atrás do cara, afinal, pq só o PT tem que ter controle sobre o que fazem seus militantes?)
De agora em diante é torcer para que o segundo turno tenha uma cara melhor do que o primeiro, e para que eleitor e candidatos contribuam para a isenção e “limpeza” dessa eleição. Apesar de achar que ataques pessoais serão o tom dessa fase, acredito que teremos discernimento para enxergar que quem promove baixaria e linchamento público, jamais poderá ser representante do Brasil que queremos.